Por Lunna Guedes
Em conversa agitada na tarde de ontem — com uma pessoa que aparenta ter raízes bem fincadas no tal capitalismo, em que o principal objetivo é o consumismo —, argumentei, sem sucesso algum, sobre minhas estratégias para o meu projeto-proposta “Scenarium”…
Não é novidade alguma que há cada vez mais pessoas interessadas em publicar livros. Nem mesmo há editoras suficientes para tantas publicações. Mas, inventa-se uma aqui, outra ali e pronto… realiza-se o objetivo: plantar uma árvore, ter um filho e escrever-publicar um livro.
O que se vê — e com alguma frequência — são leitores insatisfeitos, porque os livros são pensados para as prateleiras e não para agradar quem gosta de ler. Mas… Há exceções! Algumas Editoras pensam no leitor, oferecendo livros diferenciados. O resultado final, no entanto, acaba por pesar no bolso do público.
Você se lembra da Cosac Naif e seus belos livros? Eu ainda tenho alguns exemplares em minhas prateleiras. O acervo incluía livros de Tchekhov, Beckett, Boal, Lima Barreto e os livros lançados eram verdadeiras esculturas de papel.
Quando anunciou o fim da Editora — em 30 de novembro de 2015 —, Charles Cosac mostrava ao mundo literário, que o modelo editorial mais tradicional, baseado em uma cadeia perversa de relacionamentos entre livrarias, editoras e autores estava fadado ao fim.
As casa editoriais preferiram fingir não enxergar o óbvio… encomendaram uma nova pesquisa de opinião publica, providenciaram alguns artigos mal redigidos e trouxeram de volta o velho discurso — muito repetido na Itália também —, de que se lê pouco em terras tupiniquins.
Basta espiar as prateleiras das principais livrarias da cidade — as que sobreviveram a tormenta chamada Livraria Cultura —, para perceber o problema. Se um livro sobre vampiros vendia… providenciava-se a toque de caixa… centenas de exemplares, com a mesma temática. Lembra-se do alvoroço ao redor de cinquenta tons de cinza? — que inundou as prateleiras com sapatos, algemas e máscaras… com um sem-fim de histórias — falsamente — eróticas, que fizeram “corar” pessoas, que juraram não ler tais livros, com medo do julgamento impiedoso alheio….
A decadência do setor não tem relação alguma com a falta de leitores — que existem, aos milhares. O problema está no modelo que criou Editores menos exigentes e presos a um formato. Pouco se investe em novos autores. A preferência é sempre pelos mesmos nomes e além do desprezo pelo autor nacional, acostumou-se a fabricar exemplares de acordo com o momento… como se o livro fosse um peixe vendido numa banca e embrulhado no jornal de ontem, para o cliente de sempre, que já tem em mente o cardápio do dia.
Eu me lembro que estava em Berlim para uma semana literária — era a minha primeira participação com meia dúzia de livros por mim editados —, quando me vi no meio de uma acalorada discussão. Falava-se em um novo Norte para os livros… onde o best-seller não teria espaço, a preferência seria por pequenas tiragens e novos e bons escritores — que existem, tanto quando leitores. Momento perfeito para os pequenos-ousados e promissores livreiros — Matthes & Seitz, Kookbooks ou Secession —, que se estabeleceram na velha Capital Alemã e começavam a repensar o cenário literário.
Eu gostei de tudo que vi e ouvi… ao contrário da pessoa com quem conversei durante um bom par de horas, ontem. Ela não se convenceu a respeito da minha estratégia para a Scenarium… por acreditar que um Autor não pode e não deve se contentar com 30, 60… quiçá 90 exemplares-leitores.
E o que mais a incomodou é justamente o que mais me agrada. Sinto imenso prazer em dizer — em voz alta — ao autor-leitor: esgotou a edição. Nesses sete anos de Scenarium… foram poucos os autores que ouviram tal coisa de mim.
Quem me conhece sabe que eu sou exigente com o conteúdo que publico. Quando uma edição esgota no lançamento ou dias depois — sinto aquela sensação confortável de dever-cumprido. É passageiro! — no instante seguinte arquitetamos uma nova edição…
Eu lembrei a humana-criatura, que muitos autores que pagam por suas publicações acabam com caixas de livros amontoadas no fundo do armário, debaixo da cama, num canto do quarto sem conseguirem o tão sonhado espaço nas prateleiras das principais livrarias da cidade. Nesse caso, resta ao autor inventar-se enquanto vendedor e ter a sua própria barraca de peixes…
As redes sociais cumprem bem esse papel atualmente. Mas, são poucos os que conseguem traçar uma boa estratégia e ter sucesso. Há exemplos no instagram. Rupi Kaur ficou na lista dos mais vendidos do Times por 40 semanas, com um livro de poesias. E, pensar que, nas rodas literárias tupiniquins, o bordão que mais se repete é: poesia não vende. Aqui, no Brasil, temos Aline Bei, que fez um belo trabalho com o seu livro o peso do pássaro morto… produzido e publicado de maneira independente e, que hoje, faz parte do catálogo da Companhia das Letras… e há exemplos na Scenarium de pessoas que gritam para o mundo que tem um livro e trabalham por ele.
Caminhos há… e cada um escolhe a melhor maneira de percorrê-los. A minha bússola sempre aponta para o Norte. Certamente haverá leitores que irão gritar: prateleira à vista. Enquanto outros, irão dizer que o futuro pertence ao livro por demanda e ao digital.
O importante é saber o seu lugar no mar e navegar..